terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Crise Carcerária 2

Se, em nome da segurança pública, o estado proíbe que boates, casas de espetáculos, ginásios, estádios de futebol, cinemas, teatros etc, recebam uma quantidade de pessoas acima da sua capacidade, fiscalizando-o com razoável eficiência e, não raro, aplicando multas e outras sanções aos eventuais descumpridores das normas que assim determinam, com, inclusive, convenhamos, toda razão, já que o a estas desrespeito pode redundar em casos nefastos como o da Boate Kiss, em Santa Maria, por que será que ele próprio, o estado, não as respeita no que tange aos presídios? Como pasmo costumo dizer, como pode, assim, haver um estado, que tanto, bem sabemos, aos quatro ventos apregoa-se de direito, pretender nos impor suas leis quando ele próprio não as cumpre? Não é com base em dispositivos legais, na lei enfim, que aqueles que cometem crimes, definidos, aliás, também, como não poderia deixar de ser, por ela, a lei, são pelo estado condenados e privados de sua liberdade? Então, se se prende com fulcro na lei, há que se prender dentro da lei, ou de acordo com a lei, ou estou falando besteira? Será que pode uma prisão legalmente determinada ser ilegalmente cumprida? Parece-me claramente o caso do que temos visto, não? Alguém discorda? Bem... É claro que nem de longe eu imagino que o nosso estado, tão de direito como é, vá tratar os seus presos como sujeitos menos dignos de terem seus direitos respeitados do que os que estamos livres. Não, isso não. Jamais me passaria pela cabeça. Até porque, como bem se sabe, a própria lei, que é quem manda num estado de direito, totalmente veda tamanha absurdidade. Ademais, mesmo que, por esdrúxula hipótese, assim fosse, não nos esqueçamos de que, talvez num pequeno e excepcionalíssimo lapso deste nosso, com o perdão pela repetição da expressão, estado de direito, apesar de ulular em nossa constituição, a lei das leis, que ninguém pode ser considerado culpado antes do trânsito em julgado da decisão condenatória, há entre os que padecem em nossos presídios, que, superlotados, forçosa é a conclusão, funcionam, então, na ilegalidade, ou seja, contra a lei, no que se refere às normas relativas a sua capacidade, uma acintosa proporção de pessoas que nem sequer chegaram a ser julgadas. Pequeno lapso, insisto. De modo que, para finalizar, deixo a pergunta no ar... Por que será que o estado brasileiro, que, perdão concedido pelo novamente, ressalte-se sempre, é democrático e de direito, descumpre ele próprio as tão básicas normas de segurança pública que a nós, cidadãos, bem como às pessoas jurídicas, impõe, como são as relativas à lotação dos espaços públicos? Mistério, não?
 
Gugu Keller  

3 comentários:

  1. Um grande mistério, de fato... E o que me surpreende é que, não bastasse os presídios todos já estarem mais do que lotados, ainda há quem queira reduzir a maioridade penal e enfiar mais gente dentro deles...

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